Caminhos para o fortalecimento da subjetividade e cuidado em saúde mental da mulher negra
Não nascemos com a compreensão sobre nossa cor, gênero ou classe, somos conduzidas a partir de nossas experiências, convivências, relações, onde nos é atribuído, através do veículo da linguagem que se comunica através das instituições (família, escola, política, trabalho, cultura), os simbolismos que introjetamos e forma a imagem construída de quem somos. Ou seja, me reconheço a partir do olhar do outro.
Se uma criança negra, nasce negra, em seu vínculo de comunidade enegrecida, só vai se perceber enquanto tal a partir do contato com a preocupação dos seus pais frente uma cultura de manifestações racista e ou a partir das suas primeiras experiências racializadas, percebendo, assim, que a cor é uma questão. O racismo é uma construção social, legado de uma estrutura econômica na constituição do Brasil colonial que está impregnado nas raízes da nossa cultura, assim como a questão da desigualdade de gênero e classe.
Mas como a experiência racializada afeta a alma da mulher preta? Na construção sociohistórica, a mulher negra passa por um processo de dupla desvalorização, enquanto mulher e negra, intensificando sua condição de desigualdade, inclusive, passando por processos de desumanização. Em uma sociedade consolidada na estrutura hierarquizada de poder, pensando na imagem de uma pirâmide, a mulher, preta e pobre, compõe a base dessa pirâmide. Essa condição transforma completamente nossa estrutura psíquica, bem como nossa posição subjetiva.
Mas quem se importa com a mulher negra? Nos tornamos tão habilidosas na capacidade de sobrevivência que ativamos nossos mecanismos de defesa, escondemos nossas feridas, chicotadas como pagamento ao pertencer, mas o momento que atingimos o limite de suportabilidade sempre chega. Culpa, medo, insegurança, sentimentos persecutórios, dificuldade relacional, autoestima baixa, raiva, ansiedade, todos esses sintomas gerados pelas situações constrangedoras e violentas do racismo afetam nosso comportamento e se transformam em adoecimentos.
A cultura traduz um padrão normativo de como devemos ser, nos comportar e se relacionar, mas o que é familiar nos descaracteriza. Inclusive, cuidado com o discurso meritocrático, pois mudar sua história não é sobre alcance material, necessariamente, mas sim apropriação de seu lugar de discurso e a construção intencional de sua singularidade.
Mas qual o caminho para construirmos parâmetros para uma subjetividade mais fortalecida com nossa identidade? É preciso Resistir frente ao desejo de Existir, sobrevivemos à realidade do extermínio, mas para isso, algo em nós, de alguma forma, teve que morrer. O caminho indicado é de retorno. Precisamos nos conectar com nossa ancestralidade, nossa história, construir referências positivas para projeção, conhecer nossos verdadeiros heróis invisibilizados, fortalecer nossa rede de cuidado, ressignificar as experiências e cuidar da nossa saúde mental.
Há um oceano dentro de si a ser explorado. Cuidar do outro sempre foi algo estimulado e importante para a maioria de nós, pois somos forjadas a sermos fortes e suficiente para suportar. Compreendemos nossos limites quando somos exauridos por esse cuidado. Precisamos de cuidado, também. O conhecimento de si, dos nossos limites e possibilidades são os verdadeiros caminhos para o autoconhecimento.
Não estamos sozinhas, portanto, os enfrentamentos também são coletivos, afinal, combater o racismo é uma responsabilidade de todos/as/es. Se faz importante compreender o que nos atravessa nessa realidade que operacionaliza desigualdades e contradições, para que seja possível construir estratégias internas e externas para nossa existência.
Pois:
"Quando uma mulher negra se movimenta, toda estrutura da sociedade se movimenta com ela" Angela Davis.
Faz sentido para vocês ?
Espero que sim.
Um forte abraço, Maju Psicanálise!
Esse texto é em homenagem a todas as mulheres negras em referência ao dia 25 de julho representado pelo Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha.
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